Joe contra o vulcão

(Joe versus the volcano/1990)**

Historinha: Joe descobre que só tem 6 meses de vida e aceita a proposta de um milionário para pular em um vulcão.

Taí um filminho meio bizarro, que às vezes erra o alvo nas suas tentativas cômicas, mas também consegue gerar algumas risadas – melhor do que muitas das comédias românticas que já vi por aí…

No início, a realidade patética de Joe (Tom Hanks) me fez até acreditar que aquele seria um futuro distópico, com aquele monte de gente vestida igual deixando rastros de lixo. E todo o decorrer da trama sempre me deixou com um pé atrás se no final da jornada ele não acordaria em sua cama – muitos momentos parecem indicar coisas fora da realidade que só aconteceriam num sonho – mas cabe ao espectador concluir isso por conta própria, se quiser.

Fora alguns momentos bobos (como aquela cena da pescaria), até que é bem divertido acompanhar essa aventura: o motorista dando dicas enquanto o leva às compras por Nova York, e quem compraria aquelas malas trombolhos, mesmo tendo dinheiro? (é que elas viriam a calhar!); Joe comentar com a amada que parecia já conhecê-la antes – engraçado porque as garotas principais são todas interpretadas pela mesma atriz, Meg Ryan; um diálogo com uma jovem meio perdida na vida, “não sei o que te responder”; o fato da tribo da ilha gostar de refrigerante de laranja (?!) e ter Nathan Lane dando gritos de guerra em um idioma incompreensível; Joe afirmando que nunca teve um ato corajoso assim em vida e precisa pular, Patricia querendo casar à beira do abismo e os dois sendo expelidos pelo vulcão!

Aliás, um ponto que é engraçado, mas imprevisto à época, como hoje que conhecemos a carreira de Tom Hanks, vejo relação com outros de seus trabalhos; ele à deriva com queimaduras do sol me lembrou “O náufrago” (Cast away/2004)***; e fiquei imaginando Nora Ephron vendo esse filme e descobrindo que esse seria um casal ideal para “Sintonia de amor” (Sleepless in Seattle/1883)***.

O diretor e roteirista John Patrick Shanley é bem artístico em algumas cenas, como a da grande lua, ou no quadro na saída da consulta com o dr, também já estabelecendo elementos aqui e ali, como o abajur e os romances que antecipam os acontecimentos futuros, e o constante raio que atinge o “average Joe”.

E o que isso tem a ver com budismo?

Em uma cena no barco, numa conversa entre Joe e Patricia, ela comenta sobre um pensamento do pai dela, de que todos estão dormindo e apenas algumas pessoas estão despertas e elas vivem em constante e total “perplexidade” (amazement). Associei essa fala ao estado de um Buda, que é alguém que ,”despertou” para algumas verdades do mundo e busca um estado de “nirvana”, uma espécie de felicidade plena, ainda neste mundo.

Taí, não é que eu surpreendentemente gostei um bom bocado desse filme mais antigo e menor?

Din e o dragão genial

(Wish Dragon / 2021) **

Interessante notar como de uns tempos pra cá surgem essas produções chinesas faladas em inglês, com um suposto público alvo óbvio, embora eu não sei se é filme chinês pra americano ver ou filme americano pra comunidade chinesa gostar.

De qualquer modo, acaba contando com nomes asiáticos atraentes, como o produtor Jackie Chan (que também faz a voz do gênio em mandarim), o sul-coreano John Cho fazendo a voz do dragão Long, Constance Wu na voz da mãe, Natasha Liu Bordizzo que na verdade é australiana e Jimmy Wong na voz do protagonista Din, que esteve também em Mulan e me parece ter um carisma natural, divertido e dá vontade da gente fazer amizade.

(!) lembrando que este blog não acredita em spoilers. Se bem que… talvez você já saiba mesmo o que vai acontecer aqui.

Com parte da produção bancada por Hollywood, a parte técnica não deixa a desejar aos filmes da Disney/Pixar, até porque a Sony mesma já tem certa experiência, se aventurando por outras animações antes.

Mas talvez o grande problema aqui seja exatamente esse, o de beber muito de outras animações anteriores e não conseguir trazer nada assim tão criativo ou original. Eu não sei se existe na realidade uma lenda de gênio dragão, mas continuamente meu cérebro acaba comparando ao Aladdin (1992) **** da Disney, como por exemplo o jeitão desbocado e caricato do gênio, no início temos o protagonista fazendo acrobacias pela cidade, é escolhido por ter um coração bom e puro, é encantado por uma donzela rica, o gênio não tem o poder de fazer ninguém se apaixonar, tem outros caras gananciosos atrás do bule de chá que traz o gênio.

Eu diria que o que rende melhores risadas é quando o gênio vai descobrindo sobre o mundo moderno – mas até isso é meio que uma “correção” de uma crítica que já fizeram ao gênio azul da Disney, que logo na apresentação já brinca com referências atuais da cultura moderna (principalmente norte-americana). Assim, é divertido ele descobrir sobre a água da privada, ou não acreditar que enfrentamos aquele trânsito todos os dias, além da ideia de príncipe que ele tem ser antiquada.

Funciona também alguns dos outros desejos em meio às cenas de ação, os cachorros e a perna comprida, o toque de Midas que vira contra o feiticeiro. Outro ponto positivo foi incluírem a origem do gênio e, na minha opinião, com uma conclusão bem satisfatória.

E o que isso tem a ver com budismo?

Acho que é a minha parte favorita, que o senhor que já foi um rico lorde na vida terrena não só precisa aprender o valor da família e dos amigos, mas conseguir ter esse amor ao próximo maior que si mesmo, a ponto de se sacrificar no lugar do outro, pensar primeiro na outra pessoa, tanto que a divindade lhe concede entrada pelos portões do paraíso com direito a fanfarra; mas como ele realmente aprendeu isso, prefere fazer um acordo, mesmo que isso signifique se prejudicar de certa forma.

Dentro do budismo japonês existem algumas figuras chamadas de bodhisattvas. Dizem que são seres que alcançaram o estado iluminado, como se já tivessem encontrado a salvação e não precisassem mais ter esta vida terrena. Contudo, eles preferem adiar sua ida ao mundo espiritual e ajudar para que mais uma pessoa consiga encontrar também essa “salvação”, libertação.

Esse momento do dragão obviamente me lembrou desse conceito de bodhisattva. E também que já ouvi falar que nós é que pedimos para nascer. Aliás, algo que também me lembra o final do filme “Matrix” (1999) ****, quando Neo já despertou e volta para libertar outros… Será que é verdade? Costumamos falar: “eu não pedi para nascer!” Mas e se tivermos mesmo a chance de nesta existência fazer algo por mais almas? É também por essa linha de pensamento que na escola budista que sigo o foco recai muito sobre as boas ações em prol do próximo, as ações altruístas. Quem sabe não seja assim mesmo e estejamos por aqui para isso?

Pompoko: a grande batalha dos guaxinins

(Heisei tanuki gassen ponpoko / 1994) **

Quando a Netflix teve que dispor das animações da Disney e incluiu em seu catálogo vários títulos dos estúdios Ghibli (pra mim, pelo menos, funcionou muito nesse sentido, compensou demais!), eu achei uma ótima ideia e uma grande oportunidade para ver mesmo aqueles que eu nunca tinha tido chance ou sequer ouvido falar.

Pra mim, Isao Takahata sempre foi o carinha dos filmes mais tristes e sérios, os mais marcantes foram “O conto da princesa Kaguya” (2013)*** e “Túmulo dos vagalumes” (1988)*** – devastador. E eis que este me aparece como uma grande comédia, apesar da moral explícita de preservação do meio ambiente. Aliás, creio que essa questão ambiental e de respeito à natureza seja a verve inerente do próprio “estúdio”, que sempre vai ter algo disso nas histórias e animações Ghibli.

Apesar de conseguir dar umas risadas aqui e ali, no entanto, me fica a impressão de que é um filme repleto da cultura japonesa e que um ocidental talvez não sinta tanta graça em ver. A animação foi até o candidato sugerido pelo Japão para o Oscar (na época, melhor filme estrangeiro, não havia ainda a categoria de animação).

Historinha: gosto dessa ideia geral, dos guaxinins quererem lutar pelas terras onde moram, que os humanos estão tomando para construir cidades.

(!) lembrando que este blog não acredita em spoilers. Mesmo sabendo do que vai acontecer na narrativa, talvez você tenha reações inesperadas…

Visualmente, é divertido desenharem os tanukis como são mais aos nossos olhos da vida real, em segredo cada um com uma personalidade bem definida e cartunísticos, até chegar por vezes ao ponto de traços tão simples e molóides dependendo do estado deles. E é bem divertido, depois que somos apresentados ao poder de metamorfose deles, ganharem a dinâmica aos nossos olhos de irem se transformando. Aliado a esse treinamento para dominarem a técnica de metamorfose, há o fato de quererem pregar peças nos humanos nessa “guerra” e para mim, essas foram as melhores partes. São diversas travessuras assombrando os humanos.

Sempre tem alguns pontos em comédia que eu não consigo acompanhar, e só digo que aqui o lado devasso não me causou tanto riso, incluindo toda a extensão dos seus sacos (testículos, literalmente!). Mas achei fofo mostrarem o início de um casal, ri quando não queriam matar todos os humanos, porque senão ficariam sem fast food. Só fico imaginando que as reuniões de criação devem ser muito loucas, ainda mais com uma das sequências mais notáveis, a da “parada” de seres sobrenaturais – a legenda traduziu alguns como goblins, mas tem de tudo ali: representações de fantasmas e divindades, figuras alegóricas, do folclore japonês, fantásticas, monstros lendários do imaginário das crianças no Japão… e quem for fã de Ghibli ainda pode pegar umas referências a outros filmes aparecendo por ali.

Porém, apesar da boa premissa, ficou um pouco arrastado e com partes desnecessárias. Talvez porque eles tenham sido muito diretos na mensagem que queriam passar, fica me parecendo que poderiam ter tido menos arcos e seria tão eficaz quanto, e eu particularmente prefiro quando uma obra deixa mais sugestões e as reflexões para o público do que um recado quebrando a quarta parede no final. Mas que a gente fica tristezinho vendo os tanukis roubando lixo, fica, e talvez seja mesmo esse sentimento que queriam causar…

E o que isso tem a ver com budismo?

Pois muito bem… vou apontar aqui seguindo pelo mais fácil, assim como fizeram no filme, um visual de referência direta. Em determinado momento, comentam como os homens são pequenos, que eles vão acabar percebendo isso ao se depararem com as metamorfoses sobrenaturais. E aparece bem explicitamente um Buda inclinado, com alguns assistentes, observando tudo.

Em outro momento do filme, um dos anciãos de longe junta alguns guaxinins que não conseguem se transformar e passam apenas a rezar, e claramente fazem uma oração que é famosa no Japão, de uma das escolas budistas mais populares, rezando para o Buda Amitaba (Amida Nyorai) – que inclusive também dá as caras na parada das criaturas fantásticas.

A tal parada praticamente acaba quando um dos velhinhos acaba morrendo, e vemos um Buda e seus assistentes levando sua alma.

Junto com essas e outras aparições – acredito que tenha mais, só não estou recordando agora – poderíamos pensar que os criadores são budistas, não? Mas no filme também temos representações xintoístas e eu diria que é uma mistura mesmo de várias crenças que existem para o povo japonês. O próprio fato das raposas e dos guaxinins se transformarem faz parte dessas crenças. Embora o budismo seja muito difundido no Japão, há várias ramificações, escolas e ordens diferentes. Inclusive, integram elementos do xintoísmo e outros da tradição japonesa.

Acho que uma reflexão que fica pelo lado budista é exatamente essa da lei da natureza, que tudo se transforma, e podemos passar por guerras, nos separar de entes queridos, termos que enfrentar a morte, e não adianta acreditar que só rezar vai adiantar. A prece envolve essa consciência e precisa vir acompanhada de ações e esforços.

Alexandre e o dia terrível, horrível, espantoso e horroroso

(Alexander and the terrible, horrible, no good, very bad day/ 2014)**

(!) Este blog não acredita em spoilers. Mesmo que você saiba tudo o que pode acontecer, ainda há possibilidades de risos aqui e ali.

Historinha: um menino deseja que seus familiares tenham um dia ruim no seu aniversário.

Como um bom filme dos estúdios do Mickey, para a família toda assistir, a produção e a parte técnica não tem muitas falhas e os acontecimentos que devem ser cômicos são bem previsíveis, com aquela moralzinha no final pra tocar nosso coração. A escolha de elenco foi boa e a dinâmica da família funciona; gostei que o menino faz um personagem que adora a Austrália e ele é mesmo de lá, e é engraçado como a Jennifer Garner parece ter realmente abraçado a maternidade e estar curtindo – por isso escolher esses papeis de mamãe? Pela Disney também ela fez uma mãe em “A estranha vida de Timothy Green” (2012) e um exemplo mais recente é o “Dia do sim” (2021) pela Netflix.

Não sei exatamente o que alteraram do livro em que foi baseado (escrito em 1972!), mas as coisas azaradas que acontecem com a família nem são tão ruins assim, eu acho, tipo o bebê com tinta verde (se bem que nem seria correto fazer um bebê sofrer muito, né!). Existem sim alguns furos, por que a mãe simplesmente não pega um táxi ou uber? Algumas situações previsíveis, o roteiro avisou pelo menos duas vezes que a menina que se apresentaria como Peter Pan não deveria beber tanto xarope. Mas mesmo sabendo que o rapaz ia falhar no teste de direção, a gente não sabia que ia dar tão ruim. Aliás, a gente sabe que apesar dos percalços tudo vai ficar bem no final, inclusive o emprego em games do pai interpretado pelo Steve Carell (sempre bem, claro).

O que mais apreciei no desenho de produção foi a festa com o tema australiano, realmente seria uma festa muito “da hora” me colocando no lugar do garoto. E quando menciono sem problemas de produção isso inclui até a canção “You can fly” da animação “As aventuras de Peter Pan” (1953) do próprio estúdio, que aliás, eu não sabia, nem na Broadway foi usada.

E do filme como um todo a parte que toca o coração não se saiu mal não, é legal ver o pai “extravasar” e o menino incentivá-lo apesar de achar que esse dia está amaldiçoado, perceber que com o apoio das pessoas que amamos, nós podemos superar.

E o que isso tem a ver com budismo?

Este filme traz um tema com que todos podem se identificar, o de viver um dia que parece muito ruim, de “azar”. Às vezes a gente se apega tanto a alguma coisa específica – e nesse dia apresentado a nós, todos os personagens pareciam ter que viver momentos importantíssimos para suas vidas, cada qual em seu momento. Porém, talvez não dependa do destino – sorte ou azar – e sim da nossa própria referência. As coisas ao redor não vão mudar porque a gente acha que tem, mas nós podemos mudar, e nós podemos mudar a forma como olhamos para ela. No final do dia, essa família ficou muito mais unida através dos percalços e alguns conseguiram perceber aqui ou ali algo maior (não vou contar o bebê, que aliás também é um acerto de casting, uma graça, e eram gêmeas na realidade!).

Da ordem budista que sigo, existe um ensinamento do mestre fundador que diz que não existe dia bom ou ruim se nós conseguirmos perceber a compaixão dos budas. Talvez um dia que aparentemente seja ruim, possa ser considerado bom em outros sentidos.

3 faces e as pequenas loucuras da Mostra…

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Hoje termina a 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e eu fico pensando na época em que eu fazia aquelas loucuras. Não só de ficar o dia todo em sessões de cinema, passando de uma sala correndo pra outra, planejando os filmes que dava pra pegar e os lanchinhos que dava pra fazer, isso é de praxe. Mas e aquelas sessões que eram canceladas? Eu já peguei caso de atraso porque a lata do filme não tinha chegado, e quando acabou a luz no tal cinema? E quantas vezes não passei raiva porque não consegui a sessão que eu queria, uma vez ficando desde cedo na fila, antes de o cinema abrir, pra chegar perto da hora e vir um carinha monitor da Mostra avisar que tinha ingresso só pra metade daquela fila…

É, eu já desisti tantas vezes do cinema e acho que tô ficando gato velho escaldado, porque, honestamente, tá dando mais onda pra mim não. Em outros tempos, eu teria ido lá passar frio no Vão do Masp pra ver alguma sessão qualquer (e engraçado como sempre faz frio em algum dia da Mostra, e sempre chove em algum dia da Mostra…), só para ter o prazer coletivo de não pagar ingresso pra estar num cartão postal da cidade prestigiando cinema, apesar das luzes e buzinas dos carros atrapalhando, e um ou outro bêbado gritando no meio da sessão (sim! Mostra SP).

Em outros tempos eu teria ido ontem à exibição especial de “Central do Brasil” (1998) ****, em que prometeram presença do Walter Salles e elenco – gente, 20 anos! E pensar na minha felicidade e orgulho ao ver um filme brasileiro estar em cartaz em cinema japonês. Sim, nessa época em que estreou no Japão, eu morava por lá, entendia menos ainda do que hoje de cinema, mas tinha achado lindo.

Em outros tempos, eu teria me esforçado para ir neste último dia de Mostra, apesar do toró que caiu em Sampa, lá no Ibirapuera, fechar com chave de ouro esta temporada de filmes com “Roma”, do Cuarón. Mas vejam só, senhoras e senhores, se a gente não comete nem uma loucurinha? Não consegui pegar ingresso online para “Assunto de família” do Koreeda, e dei um jeito de sair mais cedo para ir até o CineSesc – claro que sem pretensões reais de conseguir um ingresso – mas, não contente, ainda andei (sim, encarei essa caminhada de 40 minutos) até a Cine Sala, lá pelos lados da Fradique, pra descobrir que “Infiltrado na Klan” do Spike Lee também estava esgotado. Claro, claro, um vencedor de Cannes e os dois indicados pelo Guia da Folha? Mas do que adianta a gente procurar escolher algo bom entre os 300 e poucos filmes da Mostra, não é mesmo? A Mostra é pra quem compra pacote, quem se planeja lá atrás, cinéfilo de carteirinha, se você só quer ver um filme “alternativo” tem que se contentar com pouco ou não esperar nada – Mostra é pra mostreiro.

Então, eu optei por escolher minha própria saúde – pelo menos desta vez, pelo menos este ano – e só vi um filminho só. Porque foi o que deu, e tá bom, porque afinal de contas, muita coisa acontecendo na vida por aí, né, fazer o quê.

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3 Faces (Se rockh /2018) ***

 

Daí me lembro também de que, num passado longínquo, quando eu ainda acreditava que um dia eu poderia ser cinéfila, eu achava demais ouvir que alguém tinha visto um filme iraniano. Eu pensava “que cult, um dia vou ser assim”. Pois bem, pelo menos uma vez na vida posso dizer que vi um filme iraniano. hahaha (mentira, que em algum momento da vida a gente já deve ter visto Kiarostami ou Farhadi, certo?)

Aliás, é impressão nossa ou as estradas aqui também homenageiam um pouco Kiarostami? Bem, bem, vamos lá.

Historinha: um diretor e uma atriz vão até um vilarejo constatar se um suposto suicídio de uma jovem é verdade.

: D – Aqui, as pessoas da vida real retratam a si mesmas, coincidindo o nome dos seus personagens. E não podemos ignorar que o diretor e um dos personagens principais está na verdade impedido de sair do país (e até de filmar?). Se pensarmos então quem são as 3 faces – uma aspirante a atriz, uma atriz famosa e uma artista do passado, quase esquecida/escondida no meio do nada… não é também interessante pensar que o próprio diretor se mescla com essa terceira face nesse quesito de estar escondido para fazer sua arte? E pensar em como cada um aparece, “dá a cara”; todos mais jovens usam seus celulares, inclusive para persuadir ou mostrar o que quiserem, uma figura pública tem outras preocupações.

: D – e quando os cidadãos percebem que eles não vieram ali para ajudá-los, que ninguém se importa com eles mesmo, perdidos ali no meio do nada, quase sem nem o básico (energia elétrica ou abastecimento)… não é um tapa na face, de quanto a gente dá voz ou importância a certas coisas e outras não?

: D – é esperta e aprovamos a transição de uma cena, quando o irmão está com uma pedra na mão e depois vemos aquele vidro quebrado… às vezes a gente não precisa dizer nada, só observar pra ver no que vai dar.

: D – “e vocês teriam vindo?”, apesar de estarmos com raiva por ela ter usado de subterfúgios, a gente sabe que não teriam não.

Um comentário interessante que ouvi foi que existem alguns momentos em que “dá medo” – aquela mulher andando sozinha à noite e sendo convencida a ir na casa das pessoas, ela não vai ser roubada ou pior?, o boi no meio do caminho não é um golpe? Talvez nós estejamos tão acostumados a estarmos desconfiados de tudo (assim como a gente já começa o filme desconfiando daquele vídeo, junto com Jafari), que não consigamos perceber o que na essência é o lado bom do ser humano? Sua genialidade, sua qualidade, sua pureza… E o que isso tem a ver com budismo? Na linha budista que sigo, sempre dizemos que qualquer pessoa tem o potencial dentro de si para despertar para as verdades que libertam dos sofrimentos. Quando falamos de “desapego”, isso pode significar às vezes deixar de lado alguma “maldade” que vemos, por exemplo, para descobrir a verdadeira essência boa existente em tudo. Mesmo nas pessoas mais difíceis, mesmo nas situações mais limites, mesmo em meio a algum problema.